O Homem feito de Ferro e Flor

ABC de Gregório Bezerra

Vou lhe contar uma história
Fazer uma louvação
De um herói desta nação
Cobrindo de louro e glória
Vou refrescar a memória
De quem esquece o valor
Deste grande lutador
Que nunca torceu o braço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Nasceu ele no agreste
Em Panelas de Miranda
Não chove naquelas bandas
Da uma seca da peste
Tudo morre e nada cresce.
Por isso ele se mudou
Muita saudade deixou
Foi procurar outro espaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Com sete anos de idade
Muita cana ele amarrou
Tirou conta e carriou
Com muita dignidade.
Isso só é novidade
Pra quem nunca trabalhou
Na moleza se criou
E nunca enfrentou dureza
Como Gregório Bezerra
Feito de ferro e flor.
 
 
No engenho onde morava
Na Mata Sul do Estado
Ele era até bem tratado
Todos do Grilo gostava.
Era assim que lhe chamava
Sua mãe com muito amor
Que na vida o encaminhou
Lhe ensinando a ter firmeza
Pra ser Gregório Bezerra
Feito de ferro e de flor.
 
Mas o engenho foi vendido
E o novo dono era mal
Mandava baixar o pau
Por qualquer mal entendido
Era um carrasco, um bandido
Não dava o menor valor
Para o seu trabalhador
Isso marcou muito o traço
A Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Gregório ficou chocado
Com uma cena tirana
Por ter chupado uma cana
Um homem foi massacrado
Depois de ser amarrado
Pediu por Nosso Senhor
Mas o patrão nem ligou
Isso deu régua e compasso
A Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
Botou o boi pra lamber
O homem sujo de mel
Era uma coisa cruel
Ver o seu sangue escorrer
E o homem a se contorcer
Pois sentia muita dor
Era um verdadeiro horror
Para um menino simplório
Como o menino Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
O homem morreu inchado
Pelas formigas comido
E aquele patrão bandido
Nunca foi incomodado
O Grilo ficou danado
Sua mãe se apavorou
Logo depois se mudou
Pra não ver mais malvadeza
Levou Gregório Bezerra
Feito de ferro e de flor.
 
 
Foi de engenho em engenho
Trabalhando alugado
Foi no salário roubado
Mas trabalhou com empenho
Um dia franziu o cenho
Pra Recife se mudou
Numa casa se empregou
Varreu salas e terraço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 Foi vendedor de Jornal
Pegou frete na estação
Foi operário em construção
Foi companheiro leal.
Ele nunca abriu do pau
Houve uma greve ele entrou
Cavalaria enfrentou
Topando espada e baIaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Na grave da construção
Com dezessete de idade
Aprendeu duras verdades
Nesta primeira lição
Gregório viu que patrão
Da cidade ou interior
São todos explorador
Querem viver na moleza
Não com Gregório Bezerra
Feito de ferro e de flor.
 
 
Ainda muito menino
Gregório foi pra prisão
Na casa de Detenção
Encontra Antônio Silvino
Para cumprir seu destino
Muita coisa lhe ensinou
Suas proezas contou
Da vida lá no cangaço
A Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 Na casa de Detenção
Gregório veio a saber
Que estava a acontecer
Uma grande revolução
Que acabava a exploração
De um povo sofredor
E muito jornal comprou
Pra ouvir o falatório
Que interessava a Gregório
Feito de ferro e de flor.

Da grande revolução
Que o povo Russo fazia
Quase tudo ele sabia
Ali mesmo na prisão
Sabia com emoção
Que o operário e o lavrador
Sua pátria transformou
Num grande laboratório
Isso agradava a Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Antônio Silvino lia
Para Gregório saber
Porque não sabia ler
O que os jornais dizia
Com atenção ele ouvia
Que Lenine chefiou
E o povo comemorou
Com festas e foguetório
Isto alegrava Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Cinco anos na prisão
Foi ser de novo julgado
O Juiz horrorizado
Deu sua absolvição.
Ao sair da Detenção
Para Panelas voltou
Seus parentes visitou
Foi rever o seu pedaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
E o tempo foi passando
Revendo tios e irmãos
Passou um belo São João
Divertindo e passeando
Vendo os amigos casando
Mas o folguedo acabou
Pra capital regressou
Trouxe os irmãos pelo braço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Mas não achava serviço
E para mudar de ritmo
Resolveu ir ser marítimo
Trabalhar de embarcadiço.
Mas, para conseguir isso
Um documento faltou
No Exército ele ingressou
Foi ser Caxias e Osório
Era o soldado Gregório
Feito de ferro e de flor.

Gregório incorporado
No 21 Batalhão
Pra defender a Nação
Ele estava preparado
Logo depois foi mandado
Para a Rio num vapor
Para mostrar seu valor
Seguiu junta um relatório
Que apresentava Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Gregório soldado infante
Num ataque muita veloz
João Pessoa de Queiroz
Seu primeiro comandante
Depois Nilton Cavalcante
Que com Gregório encrencou
Porém depois recuou
Com ele acertando o passo
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Cumprindo sua missão
Dois anos ele foi soldado
Com bons serviços prestados
Ao Exército e a Nação
Com a reservista na mão
Para o Recife voltou
No porto se apresentou
Pra ser do mar um sargaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Chegou na Capitânia
Para ser embarcadiço
Mas um chefe de serviço
Velo logo com covardia
Querendo ter mordomia
Duzentos mil réis cobrou
Por causa deste inspetor
Seu sonho foi um fracasso
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
Foi trabalhar de pedreiro
Trabalho não encontrou
Outro navio pegou
Voltou pro Rio de Janeiro
Tinha um pouco de dinheiro
Que logo se acabou
No porto biscatiou
Tinha um futuro ilusório
O desempregado Gregório
Feito de ferro e de flor
 
Sem ter onde trabalhar
Com vínculo de compromisso
Incorporou-se ao serviço
Geográfico Militar
Pra comer e pra morar
Para o Exército voltou
E muito colaborou
Na Vila de Deodoro
O voluntário Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Quase sem perspectiva
Aos vinte e cinco de idade
A dura realidade
Lhe deu a iniciativa
Tomou urna diretiva
Que sua vida mudou
Seu futuro planejou
No tempo e no espaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Estudou o que devia
Para poder ter assento
Na escola de sargento
Instrutor de infantaria
Álgebra e Geometria
Foi o que mais precisou
Um Sargento duvidou
Mas ele lhe disse eu faço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
Estudou um ano inteiro
E foi o melhor da tropa
Obteve a melhor nota
Entre todos companheiros
Granada, canhão, morteiro
Em armas se aprofundou
Quando os exames prestou
No curso preparatório
Saiu Sargento Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Conseguiu ser transferido
Para a sétima região
Pra servir no seu torrão
Seu Pernambuco querido.
Foi muito bem recebido
Quando em Recife chegou
Em vinte e nove casou
Na igreja e no cartório
O sargento instrutor Gregório
Feito de ferro e de for.
 
 
Mas toda sua vontade
Era acabar com a exploração
De todo e qualquer patrão
Do campo ou da cidade
Com muita tranquilidade
Seu caminho preparou
Alguns livros estudou
Pra poder dar mais um passo
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Resolveu renunciar
Seus projetos pessoais
Pra nunca voltar atrás
No que ia começar
Sua vida dedicar
A causa que abraçou
Enfrentar com destemor
O cutelo e o baraço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
Decidiu ser marxista
Lutar ao lado do povo
Construir um mundo novo
Ser um homem idealista
No partido comunista
Com muita honra ingressou
Como sargento instrutor
Já era um homem notório
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor
 
Para os pobres libertar
Empenhou-se decidido
A organizar o partido
Lá no setor militar
Começou a recrutar
Militares de valor
Todo seu tempo empenhou
Pra conseguir seu intento
O camarada sargento
Feito de ferro e de flor.
 
 
Usando mais o instinto
Em Recife e Fortaleza
Com disciplina e firmeza
Organizou com afinco
No ano de trinta e cinco
A revolta pipocou
O seu setor comandou
Muito firme e decisório
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Faltando apoio na ação
Foi preso muito ferido
Logo depois recolhido
A casa de Detenção
As torturas na prisão
Com bravura ele aguentou
Seus carrascos enfrentou
Em todo interrogatório
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Quatro anos de tormento
Naquela prisão medonha
Depois Fernando Noronha
Melhorou o tratamento
Capitão, cabo e sargento
Soldado e trabalhador
Entre os homens de valor
Rendo homenagem a Pascácio
E Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Três anos de cativeiro
Naquela Ilha tristonha
De Fernando de Noronha
Foi para o Rio de Janeiro
Junto com os companheiros
Num navio embarcou
Nesta viagem tomou
Chuva, sereno e mormaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
Distante de sua terra
Ficarão prisioneiros
Um punhado de guerreiros
Que um grande valor encerra
Quem nada fez, nunca erra,
Porém não mostra valor
Um morreu, outro escapou
Isto é público e notório
Cabo Valverde, Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
O grande herói do Nordeste
Foi o preso escolhido
Da Ilha Grande transferido
Pra uma prisão terrestre
Fazer companhia a Prestes
Grande emoção lhe causou
Muito honrado ele ficou
Juntou o mel e o bagaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
Pernambucano à cavalo
Luís Carlos Prestes é
Gregório gaúcho à pé
Pode escrever o que falo
Gregório foi abraçá-lo
Junto com Prestes ficou
A anistia chegou
Saíram para as andanças
O cavaleiro da esperança
E Gregório de ferro e flor.
 
Os grandes homens de fama
Do povo legionário
Falaram em São Januário
Campo do Vasco da Gama
Dos nomes que o povo ama
Por todos Prestes falou
Os crimes denunciou
Naquele imenso auditório
De Agliberto a Gregório
Feito de feito e de flor.
 
 
Mas conversando com Prestes
Gregório foi convencido
A organizar o partido
Na região do Nordeste
De entusiasmo se investe
Pra Pernambuco voltou
Na tarefa se empenhou
Com grande desembaraço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Com o partido legal
O operário e o camponês
Ia ter a sua voz
Mais precisava um jornal
Pra poder baixar o pau
No patrão explorador
O povo colaborou
Responsável e meritório
Massas, amigo e Gregório
Feito de ferro e de flor
 
 
O jornal por conseguinte
Saiu rodado a mão
Defendendo a eleição
E a nova Constituinte
Quando foi no me seguinte
Se adquiriu um motor
A tiragem triplicou
Era bom o repertório
De Rui Antunes a Gregório
Feito de ferro e de flor.

O comitê estadual
Reuniu com os presentes
Arruda como assistente
Pra escolher o pessoal
Pronta a chapa federal
Pra eleição se marchou
Entre os nomes de valor
Indicou-se um preferido
Era o Gregório querido
Feito de ferro e de flor.
 
 
Os votos foram contados
A eleição realizou-se
Um nome então destacou-se
No Recife o mais votado
O segundo em todo Estado
A reação se espantou
Mais onde ele passou
Recebeu beijos e abraços
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Para cumprir seu mandato
E chegar decentemente
Na casa de Tiradentes
Faltava roupa e sapato
Mas porém de imediato
O povo se cotizou
Até passagem ganhou
Neste segundo ofertório
O deputado Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Dois nomes se destacaram
Nesta campanha espinhosa
Borba e Vicente Barbosa
Que muito lhe ajudaram
Nos comícios eles falaram
Na cidade, no interior
Nem um dos três recuou
Dando nos ricos trompaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Naquela campanha bela
Gregório levou vantagem
Recebeu uma homenagem
Da grande Casa Amarela
Córrego, Morro e Favela
Maciçamente votou
Muita emoção causou
Aquele grande momento
Ao deputado ex-sargento
Feito de ferro e de flor.
 
 
Quando chegou lá no sul
Em alguns comícios falou
O Prestes representou
Na avenida Anhangabaú
Tinha gente pra xuxu
Pra ouvir o orador
O Milton lhe apresentou
Gregório deu seu recado
Como grande deputado
Feito de ferro e de flor.

No Distrito Federal
O Palácio Tiradentes
Superlotado de gente
Para o cerimonial
A Assembléia Geral
Os Constituintes empossou
Deputado e senador
um a um foram chamados
mas só tinha um deputado
Feito de ferro e de flor.
 
Porém o mais aplaudido
Pelos seus pontos de vista
Foi o chefe comunista
Secretário do Partido
O Carlos Prestes querido
O mais votado Senador
Sua cadeira ocupou
Comandou sua bancada
Onde tinha um camarada
Feito de ferro e de flor.
 
 
Com Prestes ele foi morar
Junto ao Largo do Machado
Senador e deputado
Os dois iam trabalhar
Na ação parlamentar
Destacou-se o senador
Mais porém quem atuou
De Niterói ao Estácio
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Os quinze legisladores
Os quinze cabra da peste
Sob o cornando de Prestes
Defende os trabalhadores
Contra todos opressores
E o patrão explorador
São quinze gladiadores
Contra 300 finórios
De Marighela a Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Entrou com gosto de gás
Rompendo ondas e embrolhos
Na campanha do petróleo
Em defesa da Petrobrás
Homem, mulher e rapaz
Pra luta arregimentou
O petróleo é nosso bradou
E o povo seguiu seu passo
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Gregório igual a um raio
Mobilizou o Nordeste
Para um comício com Prestes
Dia primeiro de Maio
No Parque Treze de Maio
Dia do Trabalhador
Mais de cem mil concentrou
Nenhum pelego ou capacho
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
O comício foi proibido
Pelo presidente Dutra
Mais o povo foi à luta
Muito firme e decidido
Guiado por seu partido
Seu dia comemorou
Proibido enterrou
Num gigantesco velório
Comandado por Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Doutor Pelópidas Silveira
Foi o primeiro a falar
Coube a Prestes encerrar
Aquela festa altaneira
Que levantou a bandeira
Do povo trabalhador
Os seus heróis exaltou
Da masmorra ao crematório
Olga, Lourenço e Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Na campanha nacional
Para governo do Estado
Vereador, deputado
E prefeito municipal
De Maceió a Natal
Aos comunistas ajudou
Boa semente plantou
Em todo esse território
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Esteve no Ceará
Porto Alegre, Espirito Santo
Sofreu algum desencanto
Na terra de Alencar
Foi pra São Paulo ajudar
Em Santo André discursou
No Rio Grande enfrentou
Polícia, e saiu no braço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Gregório foi indicado
E teria sido eleito
Como o primeiro prefeito
Da Capital do Estado
Mais prevendo o resultado
O governo conchavou
E uma lei aprovou
Evitou de qualquer jeito
Que se elegesse um prefeito
Feito de ferro e de flor.
 
 
Mais o proletariado
Firmou seu ponto-de-vista
Votando nos comunistas
Para ser seu deputado
Nosso Recife indomado
O seu passado evocou
Elegeu vereador
Doze comuna notório
Em homenagem a Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Entretanto os entreguistas
Lacaios do imperialismo
Tramam com grande cinismo
Um golpe anticomunista
Para barrar as conquistas
Do povo trabalhador
Que nas eleições mostrou
Que seguia lado a lado
O partido do deputado
Feito de ferro e de flor.
 
 
Seu partido foi fechado
Pelos reacionários
Industriais, latifundiários
Que se achavam incomodados
Com a defesa dos explorados
Que o partido comandou
A classe do explorador
Cometeu este atentado
Contra o povo e o deputado
Feito de ferro e de flor.
 
Incomodavam de fato
Esses poucos deputados
Por isso foram cassados
Os seus legítimos mandatos
Onde existe muitos ratos
Alguns gatos causam horror
O carrasco explorador
Calou a voz da pobreza
Voz de Gregório Bezerra
Feito de ferro e de flor.
 
 
Preso depois de cassado
A acusação dizia
Que o Quinze de Infantaria
Ele tinha incendiado
Do Rio ele foi levado
Num avião embarcou
Em João Pessoa encontrou
Um batalhão de soldado
Esperando o deputado
Feito de ferro e de flor.
 
Foi levado num jipão
Apesar de algemado
Atrás, na frente e de lado
Seguiu todo batalhão
Senhora faltou mesmo canhão
Mais tinha até batedor
Muito espantado ficou
Com tamanho estardalhaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
Várias vezes interrogado
O grande revolucionário
Acusado de incendiário
Agora ia ser julgado
Quando foi sumariado
Seus algozes acusou
A farsa desmascarou
Desatando o nó do laço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
O doutor Carlos Duarte
Com Aristides Saldanha
Desmontaram as artimanhas
Com competência e com arte
Refutaram os disparates
Que Eraldo Gueiros usou
Promotor ele acusou
Os dois foram advogado
Defendendo o deputado
Feito de ferro e de flor.
 
 
Foi posto em liberdade
Dezoito meses depois
Absolvido ele foi
Por toda unanimidade
Foi pra clandestinidade
Para Goiás viajou
A luta recomeçou
Sem temor e sem cansaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Viajou por todo Estado
Resoluto e decidido
Reorganizando o partido
Que estava esfacelado
Num ativo organizado
Os comunistas juntou
Tarefas práticas aprovou
Pela paz pelo petróleo
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Enfrentou as asperezas
Do trabalho clandestino
Organizando com tino
Varias Ligas Camponesas
Sempre ao lado da pobreza
Pelo mato se embrenhou
Muita doença pegou
Neste vasto território
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Deu testa com os tatuíras
Grandes latifundiários
Com ardor revolucionário
Topou jagunços e tiras
Afinou a sua lira
Com a voz do trabalhador
A liberdade cantou
No campo, fábrica e escritório
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Andou a pé e a cavalo
Propagando um ideal
Porém as forças do mal
Pretendia eliminá-lo
Foi mandado pra São Paulo
De um curso participou
O marxismo estudou
Encheu seu reservatório
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.

A direção nacional
Decidiu encaminhá-lo
Para o Norte de São Paulo
Preparar o pessoal
Das bases ao regional
Conferências realizou
Por seu imenso valor
Por seus serviços prestado
Foi eleito o delegado
Feito de ferro e de flor.
 
Defendeu reforma agrária
Na região do café
Pra uma aliança de fé
Camponês classe operária
Na ação revolucionária
Os melhores recrutou
A luta revigorou
Acabou com o dormitório
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Preparou em Araraquara
Um comício eleitoral
Terminou quebrando o pau
Com uma turma reacionária
Contusão, fraturas várias
Do lado a lado sobrou
Um boato se alastrou
Era grande o falatório
Botando a culpa em Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Pra não se deixar pegar
Recuou naquele instante
Pra capital bandeirante
Depois para o Paraná
Para o grileiro enfrentar
Os posseiros organizou
De uma emboscada escapou
No corpo tinha um balaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
Promoveu uma campanha
De sindicalização em massa
Enfrentando as ameaças
Percorreu vale e montanha
A vitória foi tamanha
Que ao patronato espantou
Porém se acidentou
Engessou a perna e o braço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.
 
 
Com pouca gente de fato
Pra refazer o partido
Empenhou-se decidido
A reforçar os sindicatos
Com paciência e com tato
Algumas bases montou
Mas, porém um senador
Num improviso oratório
Dedurou logo Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
Procurado noite e dia
Não podendo ali ficar
Do Norte do Paraná
Foi mandado pra Bahia
Com uma grande alegria
Para a Nordeste voltou
Seu trabalho começou
Percorrendo o território
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.
 
 
Começou na capital
Feira de Santana e Conquista
Mostrou seus pontos de vista
Na discussão principal
Debateu com o pessoal
Que do partido se afastou
Seus princípios afirmou
Com ardorosa presteza
O comunista Bezerra
Feito de ferro e de flor.

E o tempo se passando
Trazendo os seus na lembrança
Com riscos de segurança
Resolveu voltar pra casa
Pois a saudade apertava
Seu coração de avô
Pra direção avisou
Do seu gesto decisório
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.


Como quem tava sonhando
Na casa do filho bateu
A sua nora atendeu
Mais ficou desconfiando
Ele porém foi entrando
Por Jurandi perguntou
A nora então lhe abraço
Lhe mandou para o chuveiro
Foi tomar banho o guerreiro
Feito de ferro e de flor.

Depois de haver jantado
Sozinho ele se retira
Foi ver a filha Jandira
Que também tinha casado
Ficou muito emocionado
Quando seus netos abraçou
Com eles deitou e rolou
Como um autêntico palhaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.


Seis dias logo passaram
Neste encontro de emergência
Nos seus dez anos de ausência
Os seus dois filhos casaram
Os seus netos lhe adoraram
Muito alegre ele ficou
O bom momento acabou
Pois um plano organizado
Acusava o deputado
Feito de ferro e de flor.


É que havia acontecido
Um tiroteio em Maceió
Neste grande quiprocó
Um foi morto e alguns feridos
Seu nome foi envolvido
A reação lhe acusou
Botando a culpa em Gregório
Feito de ferro e de flor.

Mesmo não sendo verdade
O que o jornal dizia
Regressou para Bahia
Abandonando a cidade
Tinha matado a saudade
Pelo sertão viajou
Em Serra Talhada chegou
Não encontrou dormitório
Dormiu na relva Gregório
Feito de ferro e de flor.


Mal havia amanhecido
Foi tomar um cafezinho
Voltou ao ônibus sozinho
Quando foi surpreendido
Porque foi reconhecido
Na noite anterior
Um obscuro promotor
Provocou um falatório
Pra reconhecer Gregório
Feito de ferro e de flor.

Gregório foi provocado
Quase obrigado a falar
E o promotor a escutar
Sentiu-se sacrificado
Aí foi ao delegado
E a ele dedurou
Juntou-se a um investigador
E jogaram um grande laço
Em Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Por isso que de repente
Gregório se viu cercado
Por um grupo de soldado
Ao comando de um tenente
Tratado decentemente
O tenente lhe falou
O promotor te entregou
É um fato obrigatório
Ter que prender o Gregório
Feito de ferro e de flor.


Saiu de Serra Talhada
No avião do Governador
Mais no Recife encontrou
As ruas interditadas
Uma viatura escoltada
Pra Caxangá lhe levou
Comissário investigador
Tentaram um interrogatório
Mais não falava Gregório
Feito de ferro e de flor.

Por Álvaro da Costa Lima
Ele foi interrogado
O bacharel delegado
Foi logo mudando o clima
Naquela mesma rotina
Muita coisa perguntou
O seu roteiro traçou
Como quem seguiu o passo
De Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Goiás, São Paulo e Bahia
Por tudo ele perguntava
Gregório só confirmava
O que não comprometia
Ia amanhecendo o dia
Por Prestes ele perguntou
Tá no Brasil ou Moscou
Responda o interrogatório
Não sei respondeu Gregório
Feito de ferro e de flor.

Com as perguntas encerrada
Lhe disse o seu carcereiro
Vais para o Rio de Janeiro
Pois tens prisão decretada
A barra lá tá pesada
Ele não se incomodou
No Santos Dumont chegou
Com muito sono e cansaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.


Policial de magote
Encontrou no aeroporto
Apesar do desconforto
A barra pesada era um trote
O famoso Chico Pinote
A todos lhe apresentou
Ninguém lhe hostilizou
O clima satisfatório
Surpreendeu o Gregório
Feito de ferro e de flor.

Para a polícia central
Ele foi recambiado
Mais não foi encarcerado
Ficou num salão geral
Homens do mesmo ideal
Mais de sessenta encontrou
O vermelhinho molotov
Um comunista notório
Apresentou o Gregório
Feito de ferro e de flor.

Depois de apresentação
Aos camaradas detidos
Por todos bem recebido
Ficou muito admirado
Pois além de bem tratado
Ninguém lhe interrogou
À noite alguém lhe levou
Para um estranho auditório
Sabatinar o Gregório
Feito de ferro e de flor.

Com o auditório composto
De comissários e investigadores
Por demais perguntadores
Gregório ficou exposto
Depois de olhar seu rosto
Um policial perguntou
Tais com Stalin ou Cruchou
O partido tá no velório
Vou responder diz Gregório
Feito de ferro e de flor.


Ninguém jamais vai dar cabo
Do nosso heróico partido
Está errado o Agildo
Estou com Prestes e não abro
Me considero um soldado
Do povo trabalhador
Contra todo explorador
Sempre estarei com a pobreza
Disse Gregório Bezerra
Feito de ferro e de flor.


Mais tarde foi recolhido
Ao grande salão geral
Pro resto do pessoal
Disse o que houve consigo
Um advogado amigo
Um habeas-corpus impetrou
De manhã cedo chegou
O papel liberatório
Estava solto Gregório
Feito de ferro e de flor.

No Distrito Federal
Ele conversou com Prestes
Depois voltou pro Nordeste
Agora estava legal
Na campanha eleitoral
No Recife ele ficou
Da luta participou
Ocupando o seu espaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Apoiar Cid era justo
Pra derrotar Etelvino
E um bando de assassinos
Apoiados no trabuco
Recuperar Pernambuco
Este brado ecoou
O povo se levantou
Atendendo o chamatório
De Carlos Prestes e Gregório
Feito de ferro e de flor.

cid e Pelópidas eleitos
era grande a vibração
tomou-se uma decisão
lançar Arraes pra prefeito
foi feito logo um panfleto
a campanha começou
um homem então comandou
com a marca do seu traço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.


Gregório se desdobrava
Para ver Arraes prefeito
Pra tudo arranjava um jeito
Até seu carro empurrava
Com os comunistas contava
Entre os homens de valor
Uma frente se formou
Da barraca ao escritório
O povo Arraes e Gregório
Feito de ferro e de flor.


O povo elegeu Arraes
Foi uma vitória e tanto
Gregório foi para o campo
Viver nos canaviais
Aos sindicatos rurais
Tempo integral dedicou
Com paciência ensinou
O valor reivindicatório
Era o camponês Gregório
Feito de ferro e de flor.

Mas ele foi convidado
A fazer uma visita
Aos países socialistas
Ficou sonhando acordado
A muito tinha esperado
A ocasião chegou
Praga, Pequim e Moscou
Foi este o itinerário
Do grande revolucionário
Feito de ferro e de flor.


Alguns meses viajando
Muita coisa conheceu
Cidades, fortes, museus
Horizontes devastando
Viu o progresso avançando
Sem patrão explorador
Viu a força e o valor
Do camponês e operário
Que alegra o revolucionário
Feito de ferro e de flor.


Estava entusiasmado
Pra conhecer a cidade
Bastião da liberdade
A heróica Estalingrado
Onde o povo e seus soldados
O nazismo esmagou
Todo um exército invasou
Foi transformado em bagaço
Por homens de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Eis porém que de repente
Recebeu um telegrama
É sua filha quem chama
Pedindo pra vir urgente
A campanha pra presidente
No Brasil já começou
O Marechal Lott apoiou
No processo sucessório
O camarada Gregório
Feito de ferro e de flor.

Com competência e estrutura
O partido se dispôs
Lançou em sessenta e dois
As duas candidaturas
Pelópidas pra Prefeito
Arraes pra Governador
O comitê se instalou
Comandou com eficiência
Um homem de experiência
Feito de ferro e de flor.


O governo de Arraes
Só durou quatorze meses
Porém para os camponeses
Trouxe vantagens reais
Os seus direitos legais
O governo assegurou
Camponês se organizou
A um nível satisfatório
Ajudados por Gregório
Feito de ferro e de flor.

Aqui mudarei o mote
Pra lhe contar a ação
De um herói desta Nação
Naqueles dias do golpe
Gregório tentou a sorte
De Palmares ele saiu
Para o Recife seguiu
Deixou esquemas montados
De homens pra ser armados
Era primeiro de abril.

Em prazeres encontrou
Um bloqueio do Exército
Gregório por ser esperto
Logo o bloqueio furou
Pra sua casa rumou
Tomou café com batata
Do Jeep trocou a placa
Seguiu pra folha do povo
Ver o que tinha de novo
Para cumprir outra etapa.

Na redação não achou
Nenhum dos seus companheiros
Nem recado com o porteiro
Ninguém pra ele deixou
Para a rua se mandou
À procura de ajuda
Encontrou Diógenes Arruda
Que vinha pela calçada
E lhe disse camarada
As armas que nos acuda.


Estou pronto pra lutar
Disse Arruda decidido
As tarefas do partido
Eu irei executar
Sem poder determinar
Tarefa ao revolucionário
Gregório foi aos bancários
Mas não pode chegar perto
Acuado pelo Exército
Mudou seu itinerário.


Em lugar do sindicato
Para o Palácio marchou
Foi ver o Governador
Tinha pensado de fato
Porque no último contato
A alguns meses atrás
Gregório disse a Arraes
Tenho homens pra lutar
Arraes disse vou pensar
Mas armas para os rurais.

 
Gregório ficou ciente
Que Arraes ia pensar
Passou logo a preparar
O espírito da sua gente
Pois o golpe era iminente
E pra defender as conquistas
O marxista leninista
Tinha que mudar de tática
E adotar uma prática
Consequente e realista.

Para o Jeep na calçada
E sobe um pouco descrente
Do secretário assistente
Encontra a porta fechada
Gregório sobe outra escada
E por Arraes procurou
Perto da sala encontrou
Três gorilas carrancudos
Que lhe olharam sisudos
E prenderam o Governador.


Completamente frustrado
Gregório sai intranquilo
Pois por isso ou por aquilo
Arraes tinha farrapado
Os seus esquemas montados
Estavam prontos pra lutar
Sem armas pra levar
Numa decisão histórica
Tomou uma atitude heróica
Voltou para desmontar.


Por falta de instrumentos
Pra se defender do mal
O trabalhador rural
Sofreu um grande tormento
Porque um golpe sangrento
Tirou seu Governador
O povo trabalhador
Perdeu nesse mesmo espaço
Gregório de ferro e aço
Mas um coração de flor.

Sem armas para levar
Foi desmanchar o que fez
De Catende até Cortês
Tinha gente a lhe esperar
Mesmo tendo de enfrentar
Os capangas e os soldados
Gregório deu seu recado
Responsável e consequente
Como um grande dirigente
De todo povo explorado.

Camponeses revoltados
Queriam de qualquer jeito
Sair na raça e no peito
Para enfrentar os soldados
Foice, estrovengas e machados
Não pode enfrentar metralha
Gregório não se atrapalha
Não basta estar motivado
Precisa estar bem armado
Pra se ganhar a batalha.


Numa estrada de pissarro
Nesta missão espinhosa
Perto da Usina Pedrosa
Teve cercado seu carro
O capitão Rêgo Barros
Sua prisão comandou
Gregório não se alterou
Não podia resistir
Sem ter como prosseguir
Para o Recife voltou.


Já perto de Ribeirão
Gregório foi assaltado
Por capangas e soldados
Do Vigésimo Batalhão
Com muita disposição
O capitão protestou
Com veemência usou
Toda sua autoridade
Defendendo a integridade
Do homem de ferro e flor.

Aquela corja tirana
Jurou Gregório de morte
Pistoleiros de Zé Lopes
Da Usina Estreliana
Terror da zona da cana
Por questões salariais
Assassinou três rurais
Na esplanada da Usina
Aquela fera assassina
Hoje está com satanás.
 
A firmeza do capitão
Deixa o bando vacilante
E resolvem ir ao comandante
De Vigésimo Batalhão
Seguiram pra Ribeirão
Ao chegarem no comando
O coronel foi falando
Vão ao Justino Alves Bastos
Ele manda nestes pastos
Façam o que estou ordenando.

Algemado e amarrado
Como se fosse um dragão
No lastro de um caminhão
Gregório foi empurrado
Fortemente escoltado
O comboio se deslocou
No Quarto Exército parou
Houve a conversa primeira
De Ibiapina e Bandeira
E o homem de ferro e flor.


Gregório foi insultado
Atado de pés e mãos
Por coronéis fanfarrão
Ele foi caluniado
De traidor foi taxado
A serviço de Moscou
Com firmeza protestou
Desmascarando a patota
Dizendo eu sou patriota
E defendo o trabalhador.


Vocês sim são entreguistas
Fazendo um triste papel
General e coronel
Lacaio dos imperialistas
Com honra sou comunista
Sou combatente leal
Na tribuna ou ilegal
Não saio da minha trilha
Vocês é que são gorilas
Fardados de oficial.

Um justo estava falando
Quando um carrasco surgiu
Com o coice do fuzil
Sua boca foi calando
Gregório caiu sangrando
Sem poder dar nem um passo
Os dentes cai aos pedaços
Assim sangrando bastante
Foi levado ao Comandante
O homem de ferro e aço.


O general perguntou
O que fazia afinal
Lá pelo canavial
Gregório então retrucou
Juntava trabalhador
Pra defender a Nação
Do golpe e da traição
Contra os governos legais
De João Goulart e Arraes
E da Constituição.

E aonde está guardado
As armas, teu arsenal
Não as tenho general
Se eu tivesse armado
Não estava sendo humilhado
Tava de armas nas mãos
Enfrentando a reação
Defendendo os proletários
Contra os latifundiários
Atraso desta Nação.


Sem ter como responder
O general fica às tontas
E ao Forte das Cinco Pontas
Ele manda recolher
Negaram-se a receber
Por estar cheia a prisão
Tomaram uma decisão
Lhe entregaram ao coronel
Comandante do quartel
De Motomecanização.


Igual a um cão danado
Villoque falando aos berros
Nas mãos um cano de ferro
Rodeado de soldados
Gregório chega amarrado
Foi recebido a porrada
Com a cabeça ensanguentada
Caiu no chão desmaiado
Villoque e os seus soldados
Usam o cano e as coronhadas.

É aqui caro leitor
Camponês e operário
Progressista reacionário
Liberal, conservador
Que o martírio começou
De um homem pobre e esquecido
Por compromisso assumido
De criar um mundo novo
Em defesa do seu povo
Dos menos favorecidos.

Gregório foi arrastado
Para dentro de um xadrez
Villoque por sua vez
Com o fossinho transformado
Batia como um tarado
Babava como um demente
Xingava como um vivente
Do mais baixo meretrício
Revelando os seus vícios
Uivava e rangia os dentes.

 
Com o corpo ensanguentado
Passando por maus momentos
Seguro por três sargentos
Numa cadeira sentado
Com os punhos amarrados
Gregório não se abate
Villoque com um alicate
Arrancando seu cabelo
Criou um novo modelo
Inventou uma nova arte.

Aumenta a patifaria
Do coronel comandante
Que ordena naquele instante
E um sargento providencia
Solução de bateria
Que derrama pelo chão
Gregório só de calção
É obrigado a pisar
Na solução passear
Aquilo era a lei do cão.


Sem ter como se livrar
De tanta barbaridade
Com toda dignidade
Só lhe restava aguentar
Seus pés queimados a sangrar
Manteve firma seu porte
Planejando a sua morte
Villoque diz aos sargentos
Vai ter um enforcamento
Na praça da Casa Forte.

Com o pescoço laçado
Com três cordas ao mesmo tempo
Puxado por três sargentos
Foi para a rua arrastado
O corpo todo amassado
As três cordas esticadas
De vez em quando puxadas
Para os lados e para trás
Quase sem respirar mais
As horas tavam contadas.

 
É quase impossível expor
O que a mente doente encerre
Em frente ao CPOR
Todo cortejo parou
Villoque então conclamou
Os alunos ao linchamento
Oficiais e sargentos
Como também os soldados
Deixam o coronel danado
Não atendem ao chamamento.

Sem conseguir seu intento
Villoque mais furioso
Batia e chamava o povo
Pra fazer o linchamento
Parado num cruzamento
O trânsito interrompeu
O povo não atendeu
Gregório mais resistente
Simboliza a sua gente
Qual um novo Prometeu.


Já distante do quartel
Por sugestão de um sargento
Prossegue o espancamento
Bárbaro covarde e cruel
Na casa do coronel
Um grupo então se formou
A mulher dele chorou
Ao ver tamanha maldade
Contra um homem de idade
Feito de ferro e de flor.


O sangue coagulado
Seu pescoço circulava
Nas condições que estava
Parecia um degolado
Estava quase enforcado
A sola dos pés queimada
As pernas muito pesadas
A cabeça era um bagaço
Gregório de ferro e aço
Já não enxergava nada.

O coronel lhe batia
Gregório já quase echangue
O vermelho do seu sangue
A farda verde tingia
Muita sede ele sentia
Os seus ouvidos falhava
Mulher e moça chorava
Gregório estava ciente
Seu corpo todo dormente
De frio ele tiritava.

Se ergue naquele instante
Grande clamor popular
Todos a telefonar
Ao general comandante
Católicos, espíritas e protestante
Pedem o fim da vilania
Todo o Recife exigia
Mesmo em situação precária
A cidade libertária
Protestava e resistia.


Sem ter como se negar
Aos apelos e protestos
Justino Alves num gesto
Foi obrigado a chamar
Ibiapina e mandar
Naquele mesmo momento
Ao Villoque e aos sargentos
Na praça da Casa Forte
Livrar Gregório da morte
Evitando o enforcamento.


Mas eram todos culpados
Daquele seu sofrimento
De general a sargento
Tava tudo planejado
Gregório foi resgatado
Pra Cinco Pontas voltou
Na fortaleza ficou
Vestido só de calção
Mostrou a televisão
O homem de ferro e flor.

Mas naquele mesmo forte
Haviam lhe recusado
Dizendo aqui tá lotado
Levem ele pra Villoque
Agora as portas da morte
Gregório foi recebido
Porque haviam mentido
Tava tudo combinado
Pra ele ser massacrado
Torturado e agredido.

Com a cabeça rachada
Com os pés em carne viva
Só sua fé decisiva
Se mantinha inalterada
Tinha uma sede danada
Vontade de vomitar
Não podia mastigar
Os dentes estavam em pedaços
Gregório de ferro e aço
Não podia nem andar.


Jogado lá pra morrer
No Forte das Cinco Pontas
Com ferimentos sem contas
Sem remédio pra beber
Conseguiu sobreviver
Apesar do seu estado
O corpo todo quebrado
Porém estava seguro
De sua fé no futuro
Num mundo sem explorado.

Qual um Tupi ou Timbira
Lambendo as suas feridas
Uma presença querida
Parecia até mentira
É sua filha Jandira
Que vinha lhe visitar
Lhe abraçou a chorar
Soluçando em seu regaço
E Gregório de ferro e aço
Como um Tamôio a falar.
 
Não chore filha querida
Não larguei o estandarte
A vida é combate
É luta renhida
Uma nova vida
Um dia há de vir
Muitos vão surgir
Nesta noite escura
E contra a ditadura
Nós vamos resistir.

Cumpro o meu dever
De revolucionário
Pelos proletários
Posso até morrer
Mas com certeza hei de ver
O fim do golpe fajuta
Mesmo.

(Do livro ABC de Gregório Bezerra)

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